PINHEIRO-MA

Bolsonaro como legislador foi preguiçoso e como gestor é mentiroso

Jair cita até projetos que não receberam patrocínio da Petrobras para justificar revisão de contratos da estatal com cultura

RIO DE JANEIRO — O presidente Jair Bolsonaro postou neste domingo, nas redes sociais, um vídeo sobre a revisão da política de patrocínio cultural da Petrobras que contém imagens de projetos que não receberam dinheiro da empresa, entre elas a exposição “Queermuseu” e a peça “Macaquinhos”. O vídeo mostra uma reportagem da Globo News sobre o tema editada para incluir referência a obras envolvidas em polêmicas nos últimos anos. Bolsonaro diz que, “respeitando a aplicabilidade do dinheiro público”, determinou a revisão dos contratos da estatal ao “setor que alguns dizem ser de cultura”.

Em documento obtido pelo GLOBO na semana passada, a Petrobras apresentou a lista de todos projetos apoiados pela empresa desde 2009. Nem “Macaquinhos”, que tem uma cena com atores nus, nem “Queermuseu”, sobre o universo LGBTQI, aparecem na relação divulgada pela estatal. Também não consta no documento o filme de tema gay “Hoje eu quero voltar sozinho” (2014), outra obra que aparece no vídeo publicado pelo presidente.

O longa “Lula, o filho do Brasil” (2009) é outro citado no vídeo postado por Bolsonaro. Na lista de patrocinadores do filme não há qualquer menção a Petrobras, e ele não consta na relação dos projetos apoiados pela empresa em 2009. Procurada, a estatal informou por meio de sua assessoria que “está apurando” se houve algum tipo apoio a essas obras. A assessoria da Presidência tampouco respondeu.

No vídeo também aparece a cineasta Laís Bodansky, diretora presidente da Spcine, dando uma entrevista sobre os cortes de patrocínio da Petrobras. A edição insere na sequência uma foto dela ao lado do ator Wagner Moura, um dos alvos preferidos de movimentos de direita na internet por seus posicionamentos políticos. Bodansky comentou o caso:

— Sobre tirar fotos com artistas segue outra foto (publicada abaixo) para ele adicionar na edição que ele fez na matéria da Globo News, mas que acompanhe o texto explicando o que é a São Paulo Film Commission e sua força de trazer mais recursos e empregos para o país através dos criativos — afirmou.

A diretora da Spcine afirmou que se coloca a disposição do presidente Bolsonaro para levar números da economia criativa para uma compreensão mais profunda do que significa a área da cultura. Segundo Bodansky, a cada centavo colocado diretamente no setor mais 4 centavos são revertidos para toda a sociedade, através da geração de impostos, ou da geração de empregos. A partir do investimento em cultura outros setores são beneficiados, como transporte, alimentação e hospedagem.

— Hoje há empresas que giram uma economia gigantesca e estão ligadas diretamente a criatividade. São as maiores empresas do planeta. Então, nós não podemos tratar os criadores, os próprios artistas, que impulsionam toda essa economia, taxando eles como pessoas que não têm significado para o nosso país.

Lei Rouanet é uma ‘desgraça’

A exposição “Queermuseu” gerou  grande polêmica em 2017 após ser cancelada pelo Santander Cultural, em Porto Alegre. No ano passado, ela foi montada na Escola de Artes Visuais do Parque Lage por meio de umfinanciamento coletivo na internet . A meta inicial do crowdfunding, de R$ 690 mil, foi superada e a arrecadação total foi de R$ 1 milhão, com 1.677 colaboradores.

Na semana passada, a Petrobras, tradicional apoiadora do setor, já havia anunciado o corte do patrocínio de 13 iniciativas culturais que apoiava historicamente. A decisão veio à tona a partir de um documento enviado pela empresa aos deputados federais Áurea Carolina e Ivan Valente, ambos do PSOL, ao qual O GLOBO teve acesso. A decisão segue o plano do governo Bolsonaro de reavaliar os contratos de patrocínio da empresa.

Na quinta-feira, o presidente fez uma transmissão ao vivo nas redes sociais em que chamou a Lei Rouanet de “desgraça”. No vídeo ele reiterou que o limite de captação de recursos pela lei será reduzido de R$ 60 milhões para R$ 1 milhão por projeto. Uma das principais formas de incetivo à cultura nacional, o mecanismo foi classificado por Bolsonaro como uma forma cooptar artistas alinhados aos governos do PT.

“Essa desgraça dessa Lei Rouanet começou muito bem intencionada, depois virou aquela festa que todo mundo sabe, cooptando a classe artística, pessoas famosas para apoiar o governo. Quantas vezes vocês viram figurões, não vou falar o nome, não, figurões defendendo ‘Lula livre’, ‘viva Che Guevara’, o ‘socialismo é o que interessa’ em troca da Lei Rouanet. Artistas recebiam até R$ 60 milhões”, disse o presidente.

Por Jan Niklas (O Globo)

 

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