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A religião defende às cegas o Fascismo

Artigo escrito Sandra Fragoso (Graduanda em Pedagogia pela UFMA)

A inspiração para quem gosta de escrever pode partir do nada, simplesmente por vontade de registrar os pensamentos vindos sem questões motivadoras. Quando ocorre nesse contexto, a escrita se torna leve e descompromissada, as abordagens vagueiam, geralmente, pelo existencialismo, destacando a essência e a subjetividade humana. Diferentemente, de quando as circunstâncias nos remetem à um contexto de insegurança, por já termos vivido algo parecido que a história categoricamente registrou.

Dessa forma a escrita se torna mais do que reflexiva, se torna necessária, pois ao se estudar o objeto-o fenômeno- consideramos a possibilidade do retorno de tempos assombrosos que só causaram dor, medo, perdas e pânico. E é exatamente nesse contexto, de incertezas, que me pego desenvolvendo essas linhas sobre o presente mas que tem um pé no passado que, não são soltas e nem descompromissadas, mas amarradas em fatos históricos que, devido às atrocidades cometidas contra a sociedade, não podem e não devem ser ignoradas e, muito menos esquecidas. O dia de hoje me remete aos horrores sentidos por nossos verdadeiros compatriotas nos porões da ditadura, muitos foram mortos e torturados defendendo os direitos que hoje usufruímos.

Porém, não quero registrar aqui as barbáries ocorridas na ditadura, mas como a sociedade se uniu para sair dela, um período castrador dos direitos humanos e civis que durou longos 29 anos, de 1964 à 1983. Mas o que me fez voltar ao passado e refletir sobre essa época travada por lutas de garantias como o direito ao voto direto e por melhores condições de vida? Foi exatamente as manifestações que ocorreram hoje, 7 de setembro- que simbolicamente representa a liberdade – uma fração da sociedade insuflada pelo presidente Bolsonaro se articular em sentido contrário à defesa e ao fortalecimento desses direitos, quando em atos de desvairada  insensatez, saem para as ruas disseminando gritos de guerra e cartazes  agredindo os pilares da democracia- as instituições democráticas- principalmente ao STF e seus ministros- o  guardião da nossa Constituição Federal. É inevitável não cair em profunda nostalgia relembrando as passeatas do Movimento Diretas Já, onde a sociedade- tendo a participação de artistas, de personalidades políticas, sindicais e engajada pelos seguimentos estudantis- se uniu em torno de propósitos comuns à todos, o direito ao voto e melhorias sociais. Era lindo de se ver e de sentir a energia e a esperança  emanada pelo povo caminhando de mãos dadas rumo à um Brasil livre e melhor para todos. Em que momento essa sociedade- apesar de interesses privados distintos- se dispersou na luta pelos interesses coletivos? O que leva o povo a pedir o retrocesso dos direitos e se aliar ao discurso de ódio? De se distanciar da empatia num momento de tanta dor, o da pandemia?

Os grupos que defendem essa largada tirânica não apareceram do nada, claro que vinham se articulando faz tempo, mas de maneira tão dissimulada e sutil que passou imperceptível para a sociedade. Essa extrema direita  conservadora, encontrou na igreja, com o seu falso discurso de puritanismo e  moralismo, o pilar para consubstanciar sua politica preconceituosa, desrespeitando a diversidade sexual e de ideias. Como pode seguidor dos princípios cristãos defender a pena de morte, o uso de armas pela população civil e homens de bem, a xenofobia e atacar   a diversidade? Mas que escritos evangélicos são esses? O conteúdo bíblico mudou e não atualizaram? Porque são outros os mandamentos de Cristo que eu conheço, pois pregam a compaixão em vez de morte, amor em vez de ódio, paz em vez de guerra e, seus provérbios apaziguam e destemem os corações. Quem conhece a verdade em Cristo se liberta, não se aprisiona. E se esses que afirmam ter conhecido a verdade e esta os libertou, reflita: que verdade foi essa  que não lhe deixa ver o todo representado na política desse governo genocida, desse presidente atroz e desumano? Que não lhe deixa enxergar os que morreram por falta de vacina e de oxigênio, as altíssimas taxas de desemprego que impede a família de ter dinheiro para comprar comida, as crianças sem escola e sem esperança. Insisto: em que livro estão os princípios cristãos que você segue? Porque não estão nas escrituras sagradas que tem perpassado as gerações  e, muito menos em quem a  consciência em Deus.

O  7 de setembro de 2021, deveria entrar para a história- não por demonstrações de apoio à um estadista tirano- mas por uma resposta contrária ao chamado do presidente, como ocorreu em 16 de agosto em 1992- quando  Collor de Melo, presidente à época- convocou a sociedade para apoiá-lo diante dos escândalos de corrupção, tráfico de influência, contas fantasmas e uma gama de acusações revelados no famoso Esquema Collor- PC- tendo como resposta a contrariedade da população manifestados na união de vários correntes que eclodiu  no histórico  Movimento Os Caras Pintadas. Engajado pelos grêmios estudantis UBES e UNE, CUT, OAB e ABI, teve grande representatividade da sociedade civil. Os manifestantes vestiam a camisa do Brasi- mas não para pedir o retrocesso e, sim avanços- pintavam a cara de verde, preto e amarelo, embalados por músicas de protestos compostas por cantores de  rock, como a da banda titãs na letra “inútil”, usa a ironia em frases do tipo” nóis não sabe escolher presidente”, e também canções como” Alegria Alegria” de Caetano Veloso e” Pra dizer que não falei de flores”, de Geraldo Vandré, puxavam as multidões  que chegou a reunir  1.500.000 de pessoas.

Não tem como não retornar ao passado para poder falar do dia de hoje; não tem como não refletir sobre a incredulidade da maioria da nação diante de tamanha estupidez dos que se dizem patriotas; não tem como não refletir sobre a leviandade dos que se dizem seguidores dos princípios cristãos, usar o Seu nome para embasar suas ideias racistas, que defendem a pena de morte que não enxergam o outro, não percebem os que passam fome ou os que pereceram em uti’s lotadas por falta de oxigênio; como entender essa fração da sociedade que se nega a enxergar a realidade dos fatos?

Vale ressaltar que, o presidente Bolsonaro pode ser acusado de vários crimes, menos o de estelionato eleitoral, pois sempre foi muito claro nas suas propostas políticas de retrocessos de leis trabalhistas e sociais . Portanto, quem votou neste ser abjeto, estava consciente que legitimava  o candidato que representava as suas ideologias que segrega e exclui, que reconhece o modelo de família tradicional como único, quando não aceita o casamento entre homossexuais, que concorda com o extermínio dos índios e a desapropriação de suas  reservas  para favorecer o avanço do agronegócio-representado na  bancada ruralista- que é a favor de armar a população- representada na bancada da bala- e que é a favor da intromissão da religião  no Estado- representado na bancada evangélica. Porém, a maioria dos seus eleitores, só não sabiam de uma coisa: que estavam elegendo um fascista que, por apresentar discurso populista com soluções fáceis para quaisquer problemática da sociedade, usou a ingenuidade e a ignorância destes para adentrar no seio da religião, a igreja. Porém, agora, o cenário de farsas está bem mais claro para quem ainda não tinha enxergado a verdade. O Bolsonaro se elegeu 01 Vereador, 07 vezes sucessivas à Deputado federal e 1 vez Presidente da República pelo voto digital, como pode questionar o sistema de votação em que ele próprio saiu tantas vezes vencedor nas eleições? E por que só questionar agora? Por que criar uma rede virtual e presencial de ataque às instituições democráticas que sempre zelaram por todos os direitos que ele próprio usufruiu e usufrui? Sociedade não deixeis cegar pelo fanatismo ao apoiar um político incondicionalmente. O farsante veio para confundir, mentir, criar redes de intrigas e disseminar discursos de ódio. A afronta ao STF, principalmente, ao ministro Alexandre de Moraes, só revela o desespero de quem sabe que a casa caiu que, mais verdades ainda virão à tona e, munidas de fatos e provas.

O Estado Democrático de Direito abraça todas as religiões, todas as crenças, todas as raças e etnias, não faz acepções de sexo e nem de cor de pele, pois reconhece a diversidade e pluralidade cultural. O rito do Estado laico é a Constituição Federal, como discursa Ulysses Guimarães, em 1988, no ato da promulgação: ”Declaro promulgada. O documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça social do Brasil. Que Deus nos ajude para que isso se cumpra!”. “ A  pretexto de salvá-la, a tiranizam”.

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15 Comentários

  1. Excelente reflexão! Foi precisa e cirúrgica sem menosprezar qualquer religião, exatamente como prega a liberdade tão necessária em nossa democracia. Parabéns!

  2. Ótimo artigo, gostei muito
    Muito coerente.
    Precisamos mais do que nunca lutarmos pelos nossos direitos. Bater de frente com Bolsonaro e com os apoiadores dele.

  3. Excelente artigo!!! Palavras fortes descrevendo com exatidão a fase lastimável pela qual estamos passando. Precisamos de mais pessoas que compartilhem desse pensamento.
    É triste também perceber a discrepância entre os protestos contra o governo, principalmente agora com o grande desprazer que é ter o Bolsonaro no poder. Por enquanto, o que nos resta é a esperança de que a ditadura não voltará…

  4. Quem conhece a verdade em Cristo se liberta, não se aprisiona. E se esses que afirmam ter conhecido a verdade e esta os libertou, reflita: que verdade foi essa que não lhe deixa ver o todo representado na política desse governo genocida, desse presidente atroz e desumano? ( FRAGOSO,2021)
    Querida Sandra seu artigo representa milhares de brasileiros que independente de partido ou religião não aguenta mais suportar um desgoverno e um líder fascista que manipula a igreja e as massas em proveito próprio. Parabéns!

  5. Só não foi mais cirúrgica pois não tinha um bisturi. Mandei esse artigo para os Bolsonaristas do meu serviço. Sandra, você foi explícita e precisa. Adorei.

  6. Que orgulho de ti, que sábias palavras! Algumas dessas perguntas vêm todos os dias a minha mente e nunca encontrei resposta lógica! Acho que nunca a encontraremos, pois não há! Como podem apoiar o retrocesso, a homofóbica, a xenofobia, como podem ser contrários aos próprio direitos que foram conquistados com tanto sacrifício? Como podem usar o nome de Deus juntamente a discursos de ódio?
    A frase de Paulo Freire que diz que ” o sonho do oprimido é ser igual ao opressor ” nunca definiu tanto os hipócritas que agora nos envergonham!

    P.s: Eu li todo o artigo com sua voz! Me faça o favor de jamais parar de compartilhar sua sabedoria!

    1. Querida Élida, obrigada pelo carinho. Que Deus sempre permita pessoas especiais e sábias iguais a você cruzarem o meu caminho. Minha ‘Maju Coutinho’, bateu saudade danada aqui, você lê com a minha voz porque as nossas vozes se confundem. Bjs no coração!

  7. ‘’ Em que momento essa sociedade- apesar de interesses privados distintos- se dispersou na luta pelos interesses coletivos? O que leva o povo a pedir o retrocesso dos direitos e se aliar ao discurso de ódio?’’(FRAGOSO, 2021). Reflexão muito oportuna diante do contexto polarizado que a sociedade se encontra. A autora sintetizou em poucas linhas os fatos mais marcantes dos últimos 50 anos de história do Brasil. Parabéns!!

  8. Uma reflexão brilhante, e muito necessária. Destaco aqui, a parte do texto que fala sobre a verdade estar cada vez mais escancarada sobre quem é Bolsonaro e seu Desgoverno e, lamento em saber que ainda há pessoas que apoiam esse ser desprezível. A casa vai cair ainda mais! Fora genocida!!!

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