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BOMBA: Ex-empregado da família Bolsonaro revela segredos e supostos crimes dos integrantes

Ex-assessor de Flávio Bolsonaro afirma que ex-mulher de Jair Bolsonaro comandava esquema de rachadinha e colocou mansão em nome de laranjas

Um ex-empregado que trabalhou durante 14 anos para a família Bolsonaro afirma ter testemunhado nesse período a prática de uma série de crimes que teriam sido cometidos pela advogada Ana Cristina Valle, atualmente ex-mulher do presidente, e pelos parlamentares Flávio e Carlos Bolsonaro, respectivamente primeiro e segundo filho de Jair Bolsonaro.

Em entrevista exclusiva à coluna do jornalista Guilherme Amado do Portal Metrópoles, após se demitir por não receber o salário pedido, Marcelo Luiz Nogueira dos Santos reconstituiu detalhadamente todos os anos em que serviu à família, quando passou por quatro funções. Primeiro, trabalhou na campanha de 2002 de Flávio para deputado estadual. Entre 2003 e 2007, foi lotado no gabinete de Flávio na assembleia do Rio.

Depois da separação do presidente e de Ana Cristina, em 2007, passou a ser, a pedido de Bolsonaro, uma espécie de babá de Jair Renan, filho do casal, até a advogada deixar o Brasil e se mudar para a Europa. Finalmente, entre 2014 e 2021, trabalhou como empregado doméstico de Ana Cristina em suas casas, primeiro em Resende (RJ), e nos últimos meses em Brasília.

Marcelo confessa ter devolvido 80% de tudo o que recebeu no gabinete de Flávio nos quase quatro anos em que foi seu servidor na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj): cerca de R$ 340 mil no total.

Segundo ele, Ana Cristina foi quem precedeu Fabrício Queiroz e era a encarregada de recolher as rachadinhas não só no gabinete de Flávio, mas também no de Carlos, eleito vereador da Câmara do Rio em 2000. Somente depois da separação de Jair e Ana Cristina, em 2007, Flávio e Carlos teriam assumido a responsabilidade pelo recolhimento dos valores dos funcionários de seus gabinetes. Só que as denúncias do ex-empregado vão bem além.

Ele acusa Ana Cristina de ter formado todo o seu patrimônio, que em 2020 estava estimado em R$ 5 milhões, usando uma série de laranjas, inclusive na compra da mansão em que ela mora atualmente em Brasília, no Lago Sul, com o filho, Jair Renan.

Segundo Marcelo, Ana Cristina não alugou o imóvel, como ela conta, mas o comprou, por meio de dois laranjas, com quem firmou um contrato de gaveta, ou seja, um documento informal não registrado em cartório, para que eles repassem o imóvel para seu nome após o encerramento do financiamento.

O objetivo seria não chamar a atenção da imprensa para a compra de mais um imóvel de luxo pela família Bolsonaro – a mansão tem 1.200 m² de área total e 395 m² de área construída, uma piscina de 50 m², aquecimento solar e quatro suítes. O caso foi noticiado pelos repórteres Letícia Casado, Juliana Dal Piva, Eduardo Militão e Rafael Moraes Moura.

Marcelo conta que, inicialmente, a casa estava sendo negociada por um valor entre R$ 2,9 milhões e R$ 3,2 milhões. O ex-funcionário afirma não saber o valor final da transação, mas enfatiza que tanto ele quanto Jair Renan ouviram a advogada falando sobre a negociação.

A advogada teria usado, além do financiamento em nome dos falsos proprietários, os recursos da venda de um imóvel e de reservas que ela guarda desde a época em que comandava o desvio de dinheiro dos gabinetes de Flávio e Carlos.

Segundo ele, Ana Cristina não se envolvia no eventual recolhimento de valores dos funcionários do gabinete de Jair Bolsonaro como deputado federal, restringindo-se a articular o esquema na Alerj e na Câmara Municipal do Rio. Todo mês, segundo ele, sacava 80% de seu salário e entregava o dinheiro em espécie nas mãos da advogada. Todos os assessores de Flávio, de acordo com o ex-empregado, faziam o mesmo, bem como os de Carlos.

Após a separação do casal, quando Marcelo deixou o gabinete, Ana Cristina o levou para trabalhar em seu escritório de advocacia. Ele afirma ter sido procurado por Jair Bolsonaro, que teria lhe pedido que passasse a morar na casa de Ana Cristina, para cuidar de Jair Renan, na época com 9 anos. Ele morou com ela, como empregado doméstico, até 2009, quando a advogada se mudou para a Noruega, onde se casou novamente, com o norueguês Jan Raymond Hansen. A relação de trabalho se tornaria então uma relação de amizade, a ponto de ir visitá-la na Europa.

Em 2014, quando Ana Cristina retornou para o Brasil, Marcelo Luiz conta ter passado novamente a trabalhar na casa dela, em Resende, onde ficou até fevereiro de 2021, quando a advogada decidiu se mudar para Brasília e o convidou para acompanhá-la. Começaria ali a crise que o levou a pedir demissão, deixar sua casa e decidir contar tudo o que sabe.

“Você pensa que vou ser seu escravo?”

Marcelo Luiz acordou que receberia R$ 3 mil em Brasília, mas Ana Cristina teria descumprido o acordo e, alegando falta de dinheiro, pagava R$ 1,3 mil mensais. Todo mês, ele cobrava o valor acordado, sem sucesso. Sem meios de sair da mansão, o empregado acusou Ana Cristina de mantê-lo em condições análogas às de uma pessoa escravizada.

“Falei para ela: ‘Cristina, não sou obrigado a morar na sua casa. Trabalho para ter meu canto e em Brasília tudo é caro. Você pensa que vou ficar na sua casa e ser seu escravo? A escravidão já acabou. Você é racista. Isso é racismo. Você me tirou lá do Rio só porque em Brasília eu não tenho ninguém e não conheço nada? Acha que vou aceitar o que quer fazer comigo?’”, contou.

Em junho, ele deixou a casa, com a ajuda de Jair Renan, e passou algumas semanas no apartamento de Jair Bolsonaro, no Sudoeste, também em Brasília. Em agosto, retornou ao Rio de Janeiro, não sem antes procurar o Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal e fazer uma denúncia de violações trabalhistas contra a advogada. O MPT no DF confirmou à coluna que o empregado, de fato, fez a denúncia e uma investigação foi aberta para apurar o que aconteceu.

Marcelo nunca teve sua carteira assinada por Ana Cristina, tampouco por Jair Bolsonaro, quando o presidente o contratou para ser babá de Jair Renan. Ele conta ter conhecido a advogada por meio de um namorado dele, em 2002, que era cabeleireiro de Ana Cristina. Sabendo que ela era casada com Jair Bolsonaro, o cabeleireiro pediu a ela um emprego para Marcelo. Ana Cristina teria, então, indicado Marcelo para a campanha de Flávio a deputado estadual.

Após a eleição, Marcelo assumiu um cargo de assessor parlamentar de nível quatro no gabinete de Flávio, onde trabalhou de 19 de fevereiro de 2003 a 6 de agosto de 2007, com salário bruto oficial de R$ 7.326. A coluna confirmou no Diário Oficial da Alerj todas essas informações.

A própria Ana Cristina teria determinado a devolução de parte do salário. O esquema foi colocado como condição para obtenção do emprego. Jair, Flávio e Carlos teriam, segundo ele, conhecimento de tudo. Ainda de acordo com Marcelo, os percentuais repassados variavam caso a caso, e alguns dos funcionários eram também fantasmas.

Marcelo diz, no entanto, que, com o passar do tempo, Flávio e Carlos ficaram incomodados com o fato de ser Ana Cristina quem comandava o esquema, e passaram a ter embates com a madrasta. Ele chegou até a trabalhar com Fabrício Queiroz, mas num período em que o então PM ainda não era um dos cabeças do que o Ministério Público do Rio de Janeiro chamou de organização criminosa voltada para os crimes de peculato, lavagem de dinheiro, organização criminosa e apropriação indébita.

O MP do Rio de Janeiro já tinha Marcelo Luiz em seu radar. Ele foi uma das pessoas que tiveram os sigilos fiscal e bancário quebrados pela Justiça do Rio em abril de 2019.

A defesa de Flávio Bolsonaro afirmou para a coluna que o parlamentar desconhece as afirmações de Marcelo Luiz Nogueira dos Santos. Também disse não saber de supostas irregularidades que possam ter sido praticadas por ex-servidores da Alerj ou possíveis acertos financeiros que eventualmente tenham sido firmados entre esses profissionais. A nota ainda afirmou que Flávio sempre seguiu as regras da Assembleia Legislativa e que tem sido vítima de uma campanha de difamação.

Carlos e Jair Renan Bolsonaro foram procurados, mas não responderam. A coluna não conseguiu contato com Ana Cristina Valle. O espaço está aberto para manifestações.

Por Guilherme Amado, Naomi Matsui, Bruna Lima, Eduardo Ghirotto e Eduardo Barretto
(Colaboraram Isadora Teixeira e Victor Fuzeira)
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